sábado, 12 de julho de 2008

Médicos e Robôs

Médicos aprendem como funciona o corpo humano, como ele se defende e como é agredido com os diversos bactérias e vírus.
Só não aprendem como tratar seus pacientes. Infelizmente.

Ser médico é uma profissão de doação. Sua vida passa a não ser mais sua, assim como seus horários e seus finais de semana. Se você é médico e não sabia disso, me desculpa, mas deveria ter uma aula inaugural sobre isso em toda faculdade de medicina. Lógico que todos são vítimas de mal humor, cansaço ou problemas de família, mas seus pacientes não são culpa disso. Eles não pediram pra que você fosse médico. Gente doente busca a medicina pra se sentir melhor, pra que a dor que as atormenta passe ou amenize. Elas não vão lá pensando que o médico pode estar de mal humor e, então, disponibilizam seu tempo deslocando-se ao hospital para que o médico possa descontar suas infelicidades.

Talvez esses médicos mal educados, que olham os pacientes como vacas em um curral, resolveram ser médicos porque médico ganha dinheiro e como só se ganha dinheiro atendendo no seu consultório, esses médicos resolvem atender muito mal seus pacientes. Acabam se tornando robôs, fazendo mecanicamente seu trabalho apenas para cumprir seu papel de doutor.

Fui vítima desses robôs esse final de semana. Passei a semana gripada e isso culminou em crise asmática na sexta. Fui pro hospital Mãe de Deus porque lembrei que a Bruna ia lá quando tinha suas crises asmáticas, já que o Hospital Moinhos de Vento não atende convênios na Emergência. Chegando lá, um robô grita meu nome, eu entro dentro do seu consultório e, lendo a documentação da minha triagem, ele me pergunta o que eu tinha. Ainda bem que havia um carimbo preto em caixa alta escrito "ASMA" no tal documento. Eu, com a respiração pra lá de chiando, digo pra ele que passei a semana gripada e que estava em crise asmática naquele momento. Ele pede pra ouvir minha respiração com o estetoscópio. Inspira, expira, inspira, expira. E nada do robô falar. O robô senta na sua cadeira e começa a escrever letrinhas em um papel pequeno. Me receita uns 5 ou 6 remédios ("Vê se não toma todos juntos", ele disse) e me manda ir pra casa. E eu ali, além de perplexa, sem conseguir respirar. Quando eu me levanto, ele resolve perguntar:

- Quer tomar um bronco-dilatador?

Me deu vontade de responder: não, obrigada, gostaria de morrer em casa mesmo.

- Seria bom, né.

Nisso, o Rodolfo me manda mensagens e eu passo a responder. O robô resolve mandar eu desligar o celular (claro que eu tentei tirar uma foto do inalador GIGANTESCO, mas isso não é importante) e me dá uma lição de moral. Eu devia dar uma nele. Dizer pra ele que eu não sou simplesmente uma máquina de comprar remédio, que não está escrito na minha testa "enriquecedora de farmácia", que meu namorado veio ali me buscar e que eu estava pasando informação pra ele de onde eu estava dentro do hospital, que a minha saúde é importante pra mim e que ele deveria explicar por que eu devia tomar aquela medicação toda, inclusive a quel ele estava ministrando naquele momento. Mas eu sou ainda muito passiva (ou será covarde) nesses momentos e fiquei ali dando um /ignore no que ele falava e sacodindo a cabeça pra dar um feedback pra ele.

E tudo que eu queria fazer era uma nebulização e um raio X pra ver se não era pneumonia.

Na saída, liguei pra minha penumo pra ver se ela podia me ver. A secretária não consegue localizá-la e o máximo que ela pode fazer por mim é me marcar na segunda-feira às 10h30. Gosto muito de médicos que não podem ser localizados.

No sábado, resolvi visitar outro hospital. Fui na Santa Casa e lá, além da demora, me vi na frente de outro robô. E esse é ainda mais audacioso quando me criticou por não ter tomado a quantidade absurda de remédio que o robô de sexta me receitou.

- Isso aqui talvez tivesse te ajudado. *sigh*

Esse robô tem sua IA um pouco mais desenvolvida e me manda fazer nebulização e raio X.
E, do nada, aparece o Pablo (Spectra, Lorenzoni ou sei-lá-como-você-chama-o-Pablo).
Nessa hora, eu lembro que o Pablo trabalha na Santa Casa e é radiologista. Uma cara conhecida e um sorriso. Delícia.
Comentei com ele o fato dos robôs me atenderem e ele pede pra ver o que o robô de sexta me receitou.

- Meu deus! Essa criatura te deu um medicamento de tratamento de longo prazo pra tu tomar a curto prazo. E isso aqui é um antibiótico... Ele nem sabia se tu tava com pneumonia ou não. E dá pra ver que não é um médico novo. Que horror.

E ele concordou comigo, que eu não devia tomar aqueles remédios e ir consultar minha pneumo assim que desse.

- Se tu sentir alguma coisa, me liga.

Mais um tempo de espera, o robô me libera e me manda tomar um dos remédios que o robô de sexta mandou. Aquele que é pra tratamento a longo prazo.

Na minha priofissão, eu aprendi a fazer gracinha de usuários DISTANTE dos olhos dele. Nunca na frente. Ninguém gosta de se sentir menosprezado. Eu aprendi também que é interessante a pessoa saber o que estamos fazendo no computador dela pra que ela se sinta segura. Pra isso, eu tive de aprender a explicar termos e procedimentos técnicos de uma maneira que um leigo possa entender. Assim, se cria laços de confiança profissional.
Ninguém tem obrigação de saber a profissão do profissional que procuramos.

Se você vai se formar em medicina ou já é médico e está lendo isso aqui, pense nisso.
Trate seu paciente como gente.
Já diria Patch Adams, a amizade é o melhor remédio.

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