terça-feira, 24 de maio de 2011

Otto

Esse não é o Otto, mas ele era mais ou menos assim

De todas as fotos que tenho da minha família, achei apenas duas dos cachorros da minha irmã. E as duas são do Bacco com o Arthur.

O Otto foi meu segundo sobrinho canino. Ele era pra ser cachorro de competição. Porém minha irmã e meu cunhado o adotaram na pet shop onde levavam o Bacco para tomar banho. Ele nasceu sem uma bola. E quem quer ver um cachorro de uma bola em competição, não é?

Toda vez que os dois levavam o Bacco pra tomar banho, lá estava o cachorrão preto de uma bola. Olhando. Talvez pensando quando seria o dia dele de ir embora daquele lugar. Ele não entendia o porquê de estar ali. Tantos cachorros iam e voltavam... Quem sabe um dia seria seu dia de sorte.

Um dia foi mesmo. Mais ou menos dez anos atrás. Diretinho da pet pra casa da minha irmã. O cachorrão preto de uma bola foi batizado de Otto e assim inicia-se a parceria canina Ottobacco. Internamente, eu os chamava de Ossobuco. Dada à procedência de cada cão, foi coisinha de deus canino que eles se gostassem tanto.

Como todo casal de irmãos, tinham lá suas desavenças, mas estavam sempre juntos. Se dormiam com alguém em uma cama, iam juntos. Se dormiam no seu cobertorzinho, Bacco dormia embaixo e Otto dormia sobre o cobertorzinho. Tão iguais, mas tão diferentes. Quando iam pra represa, Otto ficava aflito que o Bacco ia nadando, nadando, nadando... Até voltar. Isso porque a primeira vez que Otto foi pra represa, ele seguiu o Bacco até que se afogou. Patinhas tão curtas não deram conta de navegar um corpo tão grande. Se estava muito sol na praia, Bacco corria por tudo e Otto brincava apenas onde o guarda-sol dava sombra. Quando meu cunhado tinha o barco, compraram uma boia pra ele com medo que ele se jogasse atrás do Bacco no mar. Se iam pra praça, Bacco corria que nem um desesperado e Otto corria um pouquinho e já se cansava. Mas latia muito! Talvez incentivava Bacco a correr ainda mais.

Até que uma pata passou a inchar.

Otto andava um pouquinho e lá estava aquela pata sangrando. Nenhum veterinário descobriu o que ele tinha. Resultado: os passeios foram cada vez mais encurtando. Veio a gravidez do Arthur. Bacco super interessado no que acontecia na barriga que crescia; e Otto, desinteressado. Veio o acidente do Bacco. Bacco no hospital entre a vida e a morte e Otto procurando-o pela casa inteira. Chegava a dormir no quartinho do Arthur esperando que Bacco aparecesse. Veio a crise de coluna do próprio Otto. Veio o tumor do Bacco no sovaco.

Vieram muitas coisas.

Inclusive uma paralisia nas patinhas traseiras do Otto. Otto passou a usar fraldas porque não conseguia ir no jornal sozinho. Mesmo assim, lá estava o cachorrão preto de uma bola. Feliz! Era chamar o bicho que ele vinha se arrastando, literalmente, pra te cumprimentar.

Hoje, conversando com minha irmã, ela me disse que uma semana atrás esse quadro mudou. Aquele cachorrão preto de uma bola não era mais o mesmo. Estava apático, caidinho. Até se cobriu. Minha irmã achou que era o frio. Mas quando o tempo melhorou e o cachorrão não, hora de levar pro hospital.

Ele ficou la durante uns três dias. Apático, sem alegria. Chamava e ele nem olhava pra pessoa. Parecia que, agora, era ele quem queria escrever sua própria história. Nem todo mundo é forte todo tempo que nem esse cachorrão preto. Minha irmã disse que no sábado houve uma pequena melhora, mas nenhuma notícia animadora que aquilo seria apenas uma fase e que ele voltaria a ser aquele cachorrão preto de uma bola feliz, mesmo se arrastando.

Ele teve uma vida feliz. Logo que entrou nas nossas vidas, não gostava de carinho com o pé. Fugia. Vai ver ele era maltratado. Depois aprendeu que o pé era nada mais nada menos que a extensão da mão humana quando os humanos não queriam ir até o chão. Viu o mar, a represa. Viu o Arthur nascer (mesmo que não se interessasse muito).

Hoje ele virou uma estrelinha no céu canino.

3 comentários:

  1. Que homenagem bonita =)
    Caiu uma lágrima no fim do texto. Mas não consegui não rir com o "não conseguia ir no jornal"!

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  2. Oi, Pri,
    primeira vez que comento aqui. Eu chorei com seu post tão lindo. Você escreve bem, com ritmo, com emoção...

    Li também do incidente com o Bacco. Ele se recuperou?

    beijo grande,

    Renata

    (Sabe, por uns anos tive um blog assim, meio pessoal. Não era pessoal, exatamente, porque era de escritos literários, mas não autobiográficos. Ao mesmo tempo, era pessoal porque saía de mim, das minhas veias e entranhas. Agora elas se calaram. E ele está lá, parado, à espera. Da morte ou da ressurreição. Trago um estigma em mim, que vem já marcado a ferro na pele, que vem no meu próprio nome de renascida. Então, quem sabe ele também não renasce?).

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  3. Oi, Renata!

    Que legal te ver por aqui. :)

    Eu me lavei chorando escrevendo o post. Aliás, passei o dia chorando escondido porque minha mãe me ligou no meio da manhã pra dizer que o Otto já tinha virado estrelinha e eu tava no cliente... Tive de me enfiar no banheiro... Foi lindo. :)

    A gente diz que o Bacco é highlander. Ele já tirou uns três tumores do sovaco depois que foi mordido pelo rottweiller... Esse morre de velho com toda certeza. Minha irmã me disse que ele deu uma estranhada de ficar muito tempo sozinho e andou aprontando. Pelo menos antes, os dois se faziam companhia. E o Otto era muito mais dependente do Bacco do que o contrário.

    O mais doído foi ouvir minha irmã contar que meu sobrinho (o Arthur, ele tem 4 anos) entendeu direitinho o que era "virar uma estrelinha". Chorou tanto... Agora ele conta pra todo mundo que o Otto virou uma estrelinha. Amo esse guri. :)

    E eu mantenho meu bloguito porque eu moro longe da família. E quando a gente demora pra se falar, sempre tem um "li no seu blog..." hahahaha.

    beijos!

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